Hoje, de repente. É mesmo como se fosse de repente. É festa dos meus 50 anos de sacerdócio. É tão bom celebrar. Estou feliz. Outrora, num dia tão antigo e sempre novo para mim, um jovem se entregava inteiramente ao serviço do Senhor e do povo de Deus. Quando digo entregava-se inteiramente, tenho consciência de que era mesmo uma entrega total. Com uma determinação sem reservas. Eu não estava escondendo nada. Não guardava para mim nenhum segredo.. Estava inteiro. Ali. Naquele rapaz prostrado diante do altar, num dia frio cheio de neve lá fora. O coração quente, abrasado. Prostrado diante do altar como quem morre. E me levantei ressuscitado. Eis-me aqui. E em silêncio o bispo Josef Schneider impôs-me as mãos. Em silêncio. E neste silêncio a Palavra se fez carne novamente e me recria para ser profeta missionário do Senhor. E fui integrado na fileira dos servos do Senhor. Na corrente ininterrupta da missão, do profetismo, de uma nova força e poder que vem do amor…. não pelo sangue ou pela vontade da carne… mas pelo poder da ordem o bispo retirou as mãos de minha cabeça, mas a mão do Senhor permaneceu sobre mim. Como se deu com Timóteo (1 Tm 4,14), também sobre minha cabeça, fraternalmente meus irmãos presbíteros impuseram sobre mim suas consagradas mãos… para que viva e atue sempre em mim um só espírito, uma só força, uma só missão, um só profetismo dentro do presbitério. Me levantei presbítero do Senhor.
Sorri, chorei, recebi abraços, tornei-me outro Jesus presente. Tornei-me pescador de almas e de homens, passei a amar os homens e as almas, a aliviar as dores dos homens e das almas, a ajudar os homens e as almas e passei também a ser ajudado pelos homens e pelas almas. Me tornei garimpeiro do coração… íntimo seguidor do amor. Tive dificuldades na minha vida de padre, tive, mas nunca voltei atrás em minha entrega, nunca fui infiel à minha vocação e com a graça de Deus me esforçarei para vivê-la até o fim. Com aquela consciência, com aquele temor de Deus que se apoderou de mim quando alguns dias depois de ordenado, alguém chegou perto de mim e pela vez primeira me pediu: bênção padre. Confesso que tremi e hoje não sei viver sem as pessoas me recordarem o que eu sou: Padre. Bênção, padre. Depois de 50 anos ainda sinto o nervosismo da primeira missa todas as vezes que celebro a Eucaristia. Já são 50 anos que me separam daquele 03 de março de 1968. Uma longa caminhada sem dúvidas, entre luzes e sombras, entre graça e pecado, entre encontros e desencontros. Tudo registrado nos anais e nos pergaminhos da eternidade. Êxitos e fracassos marcando o caminho. A história não é mais a mesma quando a natureza divina se mistura com a nossa natureza. Por isso a nossa história hoje não é mais a mesma de 50 anos atrás. Tudo isso nos leva a agradecer, a cantar um canto novo e celebrar um júbilo sem fim. Que as saudades do ontem e as preocupações do amanhã não estraguem o nosso hoje que nos cabe viver intensa e pastoralmente. Celebrar 50 anos é celebrar uma história que fala de tantas e tantas pessoas, de tantos e tantos fatos, de tantas buscas, de épocas diferentes, mas com um só objetivo: fazer os filhos se encontrarem com o Pai que está no céu e que caminha conosco.
O ano 1968 é memória viva minha, mas, o ano de 2018 é celebração de todos os que tem a necessidade de encontrar e amar Jesus e guardá-lo no coração. Agradeço a Deus por ter me escolhido e me tomado para ele assim. A única resposta que posso dar a Deus por este jubileu de ouro é: Obrigado, Senhor. Obrigado Senhor. Sei em quem coloquei a minha confiança como fala o apóstolo. Sei que tudo posso naquele que está e que caminha comigo me fortalecendo. Que seria de mim se não fosse padre? Padre, apesar da pequenez de quem Ele escolhe. Um obrigado aos irmãos que caminharam e que caminham comigo. Ninguém é capaz de fazer o bem sozinho. Neste jubileu eu vejo tantos irmãos daqui, dali e de longe ao meu lado realizando a obra da e de Igreja. É imensamente generoso o coração do povo de Deus. Essa multidão que no dia a dia vive fazendo o bem sem aparecer. Por isso nunca me senti só. Obrigado comunidade abençoada por Deus e protegida por Sant’Anna. Obrigado, Dom José Eudes, amigo, irmão, pai, pastor. Obrigado pelo amor que o senhor despertou nesta comunidade desde aquele primeiro dia chuvoso em que o senhor esteve aqui. Obrigado, Pe. Reginaldo, por ter aceitado o nosso convite e por suas palavras. O povo de Pirapetinga e eu temos orgulho de você. Obrigado irmãos e amigos no presbitério e todos os presbíteros que vieram de perto ou de longe. Somos destinados a sermos o louvor da glória de Deus, louvor em palavras e em cânticos.
Às minhas mães no céu, Maria de Nazaré, com o título de Nossa Senhora das Dores e Umbelina Rita que me gerou e me educou para a ternura. Aos meus pais no céu, o Eterno que me chamou ao sacerdócio e a Geraldo Alves Rodrigues que me ensinou a ser humano e cristão praticante.
À minha família aqui presente. Deus lhes pague , família Rodrigues, pela renúncia, pelas saudades contidas. Milhares de pessoas me ajudaram a ser padre, pessoas que me ajudaram e que estão no céu, mas se não fosse vocês, irmãos amados e queridos… 50 anos. Recomeçar. É a tônica da vida. Quero reaprender cada dia a ser padre. Só padre. Sempre sabendo que só o amor ao Senhor, a cada um de vocês, filhos espirituais, e ao sacerdócio não sucumbe ao cansaço. O que fica de todos esses anos é um enorme, enorme Deus lhes pague.
É impossível ser padre e feliz sem afeto de gente como vocês.
Que Deus nos abençoe a todos.
Mons. Waltencyr
Pirapetinga, 03 de março de 2018.