Dom Edson Oriolo
Nosso tempo é marcado por uma fé que se expressa em manifestações simbólicas e mesmo estéticas diversificadas. É missão dos pastores da Igreja orientar os fiéis para que a banalização e os excessos não comprometam o sentido estes sinais seculares têm a missão transmitir.
Nestas últimas décadas, tenho notado a variedade e multiplicidade no comércio de imagens sacras. Representa-se em profusão a Trindade, mistérios, Nossa Senhora, santos, santas, mártires, beatos, veneráveis. As imagens são mínimas, pequenas, médias, grandes ou enormes. Apresentam-se confeccionadas em diversos materiais: gesso, cimento, resina, cera, pedra etc. Algumas são disponibilizadas com decorações exóticas como lantejoulas, motivos luminosos, estampas e etc.
Neste vastíssimo comércio, há até pequenas imagens sacras que representam Nosso Senhor, Nossa Senhora ou os santos com feições infantis, semelhantes àquelas bonecas plásticas com as quais as crianças brincavam no passado, embora de resina. A criatividade supera todos os limites imagináveis.
No mesmo sentido, imagens sacras antigas, algumas raras ou valiosas pela expressão artística, são buscadas com grande interesse. Tanto que o tráfico de obras de arte, particularmente arte sacra, é considerado um dos crimes mais lucrativos praticados no mundo e as Igrejas de Minas são um alvo sempre perseguido.
Muitas vezes, em nossas comunidades de fé, a veneração de imagens é, também, banalizada. Não apenas a exposição de imagens defeituosas ou indignas, mas a forma como zelamos pela sensibilidade dos fiéis. Não raro, uma imagem levada em procissão ou objeto da veneração carinhosa do povo, no dia seguinte está no chão, relegada a algum depósito, dividindo espaço com todo tipo de materiais, sem qualquer senso de sacralidade.
Percebo que muitas pessoas, mesmo fiéis praticantes, adquirem e colecionam imagens sacras com a finalidade de enfeitar casas, salas, consultórios e etc. Alguém chegou a me “explicar” que as imagens ajudam a criar um ambiente leve, suave e místico. Torna-se, de mais a mais, cultural possuir imagens sagradas como objeto de decoração.
Diante disso, perguntamo-nos: as imagens sacras, destinadas à devoção, prestam-se, também a decorar ambientes? Sabemos que as imagens nos recordam as pessoas divina e aqueles e aquelas que chegaram à santidade, por graça de Deus, e são exemplos a serem seguidos em nossa vida cristã. A imagem sacra, enquanto sinal do sagrado, deve nos convidar à oração e meditação e, em razão disso, merecem a nossa veneração.
No dia 4 de dezembro de 1987, por ocasião do 12º centenário do II Concilio de Nicéia (787), o Papa São João Paulo II escreveu o documento Duodecim Saeculum sobre a veneração das Imagens. São João Paulo II recorda que o Concílio de Nicéia definiu a legitimidade da veneração das imagens na Igreja.
Naquela assembleia, os participantes acolheram, por unanimidade, a proposta dos legados romanos de introduzir na aula conciliar um venerável ícone, para que todos os padres pudessem prestar-lhe veneração. Além do mais foi definida a aprovação de que o Senhor, a bem aventurada Virgem Maria, os mártires e os santos fossem representados em formas pictóricas ou plásticas para favorecer a oração e a devoção dos fiéis.
São João Damasceno (676-749), doutor da Igreja, último dos padres da Igreja e defensor da veneração as imagens ensinou que “a beleza e a cor das imagens estimulam a minha oração. É uma festa para os meus olhos, tanto o espetáculo do campo estimula meu coração a dar glória a Deus”.
Percebemos, portanto, qual o ensinamento da Igreja sobre a veneração das imagens sagradas. Elas possibilitam a contemplação de um mistério divino e nos recorda o exemplo de fé daqueles que nos precederam no seguimento ao Evangelho. O culto cristão das imagens não é contrário ao primeiro mandamento, que proíbe os ídolos, com efeito, a honra prestada a uma imagem remonta ao modelo original e quem venera uma imagem venera nela a pessoa representada (CIC 2132).
O Papa Gregório Magno insistiu no carácter didático das pinturas nas Igrejas, úteis para que os analfabetos, ao contempla-las, pudessem ler, ao menos nas paredes, aquilo que não são capazes de ler nos livros, e acentuava que está contemplação devia levar à adoração da única e onipotente trindade santíssima (DC 8). Basta perceber o carinho das pessoas simples e humildes com o seu oratório ou espaço onde reúnem as imagens para fazerem suas orações.
Como recorda João Paulo II, os santos Nicéforo de Constantinopla e Teodoro Studita consideravam a veneração de imagens como parte integrante da liturgia. Assim como a proclamação dos textos sagrados, permite a audição da Palavra viva do senhor, a exposição de imagens sacras permite àqueles que a contemplam o acesso aos mistérios da salvação mediante a visão.
O Papa Francisco, quando esteve no Brasil em 2013, fez questão de viajar do Rio de Janeiro para o Vale do Paraíba para venerar a imagem de Nossa Senhora Aparecida, no Santuário Nacional, e, em seguida, presidir a Santa Missa no mesmo santuário. A forma devota como se coloca diante de imagens sagradas, sobretudo de Nossa Senhora, ao final das missas que preside, é um belo testemunho de legítima veneração.
Devemos, portanto, como ensina o Papa São João Paulo II, manter o costume de expor imagens sagradas à veneração dos fiéis nos templos, zelando para que surjam obras de arte com qualidade verdadeiramente eclesial. É igualmente legítimo e louvável promover o uso nas residências, apenas para finalidades piedosas. Frente ao exposto, concluo que as imagens sacras existem com o fim exclusivo de serem veneradas (oração, meditação, devoção) e não para decorar ou enfeitar ambientes.