(*) Dom Edson Oriolo
Apesar de a Páscoa judaica e a Páscoa cristã serem festas móveis com enfoques diferentes, demonstram a mesma razão de ser. A Páscoa judaica relembra a libertação do povo judeu da escravidão no Egito. Segundo a narrativa judaica (cf. Ex 12,1-50), Moisés realizou a libertação dos hebreus da escravidão, logo depois das dez pragas no Egito. Os hebreus foram libertados e autorizados a retornar para Canaã, a terra prometida onde correm leite e mel (cf. Ex 3,8).
A Páscoa cristã teve origem na tradição judaica, a qual foi celebrada por Jesus com seus discípulos. Porém, no cristianismo, ela passou a ter um significado de salvação. Ela é a celebração da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. É o fundamento da fé dos cristãos. É a razão de ser da Igreja. São Paulo, considerado apóstolo por ter feito a experiência do ressuscitado, nos ensina: “Se Cristo não ressuscitou é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé” (1Cor 15,14).
Portanto, a Páscoa cristã tem suas origens na Páscoa Judaica. Essas solenidades sempre foram muito bem celebradas tanto pelos judeus como pelos cristãos. Entre estes últimos as diferenças podem ser resumidas pontualmente entre cristãos católicos, ortodoxos e protestantes (entre os protestantes existe uma gama de vertentes).
Até o século IV, as celebrações da Páscoa judaica e da Páscoa cristã aconteciam no mesmo dia. No entanto, a partir do Concílio de Niceia (325), o primeiro concílio ecumênico, quando se afirmou Jesus como verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus e se fixou o conteúdo da fé cristã, decidiu-se que a Páscoa cristã deveria ser celebrada em uma data diferente da Páscoa judaica, devido aos diferentes significados das celebrações. Por isso, nós, católicos, celebramos a ceia pascal o mais próximo possível da festa judaica, já que a Páscoa, memória da Ressurreição do Senhor, ocorre no primeiro dia da semana após o Pessach (Páscoa Judaica). A transição do sentido teológico da Páscoa judaica para a Páscoa cristã reflete esse novo significado, centrado na salvação e ressurreição.
Historicamente, o calendário gregoriano, aderido pela Igreja do Ocidente, trouxe um cisma litúrgico com a Igreja do Oriente, que ainda utiliza o calendário juliano. Porém, neste ano de 2025, ocorre um momento raro em que os calendários católico romano e ortodoxo coincidem, celebrando a Páscoa no mesmo dia, 20 de abril. Papa Francisco, ao ser indagado sobre a coincidência das datas, destacou seu desejo de promover um encontro ecumênico para celebrar o 1.700º aniversário do primeiro concílio ecumênico. Enfatizou ainda a importância de retomar uma data unificada para a celebração da Páscoa. Superar essas barreiras temporais e litúrgicas para celebrar a Páscoa de forma conjunta representa um esforço ecumênico significativo entre católicos romanos e católicos ortodoxos, refletindo um desejo profundo de unidade dentro do cristianismo.
Olhando para as ideias do papa Francisco sobre a unidade, na Evangelii Gaudium (EG), vemos a importância de desenvolver uma comunhão nas diferenças, tornando a solidariedade facilitadora para alcançar a unidade multiafecatada geradora de nova vida (cf. EG 228). Assim, a reconciliação torna-se sinal distintivo para a paz (cf. EG 229). Essa coincidência de datas da Páscoa entre católicos e ortodoxos, em 2025, oferece uma grande oportunidade para reaproximar essas tradições. Regozijar-se com essa convergência de datas nos permite vivenciar o mistério pascal de forma ainda mais profunda e orgânica.
Nós católicos, romanos e ortodoxos, temos muitas coisas em comum, principalmente a fé em Jesus Cristo, o Messias esperado pelos judeus, Deus de Israel, eterno e consubstancial ao Pai, encarnado, que veio redimir a humanidade. A tradição, como fonte viva e contínua de revelação, juntamente com Escritura, valoriza a preservação dos ensinamentos e práticas dos primeiros cristãos. Que esse momento seja o comprometimento cada vez mais profundo com Cristo Ressuscitado.
DOM EDSON ORIOLO
Bispo da Igreja Particular de Leopoldina-MG. É formado em Filosofia pelo Seminário Nossa Senhora Auxiliadora de Pouso Alegre-MG e em Teologia pelo Instituto Teológico Sagrado Coração de Jesus, de Taubaté-SP. Mestre em Filosofia Social pela PUC-Campinas; especialista em Aristóteles, pela Unicamp; em Marketing, pela Universidade Gama Filho, onde também fez a pós-graduação em Gestão de Pessoas.