O amor é sempre uma resposta consistente. “Deus é amor” (1 Jo 4,6). Apraz pensar sobre o amor suscitado naquela noite santa, expressão daquela mesa sagrada, que curiosamente ocorreu à noite. Amor de sacrifício, mas com sabor de ressurreição. Alimento eterno para uma esperança que nunca decepciona (cf. Rm 5,5). Ao rememorar aquele santo acontecimento, daquela refeição sagrada, surge a questão: o que Jesus intuiu com aquela atitude? Evidentemente o gesto de lavar os pés expressa o sentido. Os discípulos não compreenderam, ou por estilo, não compreendemos.
Com efeito, ao contemplar as sagradas páginas do Novo Testamento, é notório que pedagogia amorosa do Mestre é a pedagogia das exceções. Se não fosse assim, talvez não tivesse amado o leproso (cf. Lc 19, 1-10), a samaritana (Jo 4, 1-26), Zaqueu (Lc 19, 1-10), a mulher sírio-fenícia (Mc 7, 24-30), não teria curado o servo do centurião (Lc 7, 1-10) e nem mesmo curaria em dia de sábado. Quantos exemplos poderiam ser acrescidos aos citados, o Mestre amou no ‘contrassenso’ das regras, dos mandamentos, além do vértice da lógica. Amou no horizonte da exceção, excepcionalmente.
Ao lavar os pés dos discípulos revela grandemente essa pedagogia da exceção. Ama a partir do mais sujo do humano, do mais repugnante, do mais evitável, Ele ama. Ama onde o ser humano nem ousaria amar. Reorganiza a geografia dos sentimentos e da sensibilidade, reescreve o gramática da percepção, percebe pelas exceções. Pensando assim quantas vezes percebemos que somos também uma exceção a ser amada, a ser querida.
A Eucaristia suscita essa pedagogia. Basta pensar os doze que ladearam a mesa com Jesus. Se não fosse o amor pelas exceções, talvez não estariam ali. E nossas missas? São sacramentos da pedagogia de Jesus? A Eucaristia que comungamos implica tal sentimento? Os altares são como o altar que Jesus instituiu a Eucaristia? Os que rodeiam o altar hoje assemelham-se aos que ladearam outrora? Ou ficam de fora por não estarem nas regras? Tais indagações surgem ao contemplar as “exceções” de Jesus.
É próprio do humano estabelecer critérios, normas, padrões, estilos para tudo e todos. Faz parte da identidade civilizatória. Mas, percebe-se no mais substantivo de si mesmo, exceção a todos os critérios, no que tange seus sentimentos e quando seu coração é desejoso do amor. Precisamente aí, revelamo-nos como os mais surpreendentes no desejo de sermos amados: quando menos merecemos é justamente quando mais precisamos. No vértice desse antagonismo o Amor do Divino pedagogo nos encontra e nos reabre à esperança. O Amor nos encontra na nudez, no pior, no mais escuro de nós mesmos, na desproteção e na insegurança.
Jesus de Nazaré, em Sua cruz, revelou que amar não é saboroso todos os dias, mas é um exercício semântico e existencial urgente. A Eucaristia que comungamos suscite em nós esse sentimento de Jesus, essa sensibilidade, tal capacidade amar além das aparências, além dos olhos, retirar nossos sentimentos do labirinto frio que é a distância de Deus. Compreender o amor com teor de esperança. Recordar sempre que, por vezes somos a exceção a ser amada por Deus e, por isso, exercitar a pedagogia do Divino Mestre e, também amar na exceção.
Padre Alessandro Tavares Alves
Diocese de Leopoldina