O capítulo oitavo de São Mateus traz a história do centurião que procura Jesus e, na oportunidade, intercede pelo seu servo. O Mestre se oferece para ir à sua casa, mas ele, revela-lhe sua indignidade e confia em sua palavra (cf. Mt 8, 5-13). Com efeito, reside aí um grande significado, a metáfora da vida, a presença de Jesus na indignidade do homem. Salvaguardando as estreitas latitudes hermenêuticas, é possível perceber na translúcida beleza do texto a habilidade de Jesus de habitar o inóspito, o inabitável (na lógica humana).
Jesus interpreta a estranheza do humano, passeia nos meandros do frágil e descortina a identidade do ‘ser gente’. Perito em humanidade e especialista em sentimentos, Ele sabe das surpresas inerentes aos corações das criaturas. Compreende que, tantas vezes, a vida se alimenta de contradições inexplicáveis.
Ele, como tradutor mais profundo do mistério humano livra o próprio homem das burocracias existenciais, as dificuldades criadas pelo próprio ser humano para chegar ao âmago de si mesmo. Olhar-se como realmente é e não ter medo do que encontrar. Jesus de Nazaré sabe transitar na sucessão de absurdos que marca a existência humana, livra-a dos naufrágios do cotidiano. Ele sorri para o homem e esse sorriso muda tudo. A vida humana é e precisa ser lugar, morada de Deus.
O famoso ditado: “Deus escreve certo por linhas tortas” ganha consistência semântica quando torna-se possível depreender que o humano é a “linha torta”, na qual, Deus escreve certo. O Amor tangencia a imperfeição, faz nela uma reinterpretação, conferindo-lhe novo significado, abrindo-a novamente à vida. Neste aspecto, depreende-se a capacidade de Jesus de não estranhar-se com nada que é humano e, além disso, ser capaz de acolhida e misericórdia.
É possível, nesta linha de percepção, recordar a famosa obra de Lewis Carrol, “Alice no país das maravilhas”, quando em determinado momento, a protagonista é levada à conclusão de que o país das maravilhas existirá quando ela encontrar alguém que lhe fizer sorrir o coração. Ou seja, o país das maravilhas não está no lugar, mas na existência.
Com efeito, daí se entende que a indignidade da morada que Jesus deve visitar, transformar-se- á em um sorriso do coração e, mais ainda, depreende-se que é na reciprocidade dos sorrisos que a vida se dá, é precisamente onde o coração sorri que o homem descobre-se a si mesmo, realiza-se em si e em Deus, seu criador e Pai.
Padre Alessandro Tavares Alves
Diocese de Leopoldina